terça-feira, 26 de fevereiro de 2013

Antes tarde que nunca

(Artigo publicado originalmente na edição de hoje do Correio Braziliense, a respeito da intervenção do Governo do Distrito Federal em três empresas de transporte coletivo urbano do Grupo Amaral)


por Paulo Cesar Marques da Silva*

A assunção pelo GDF de empresas prestadoras do serviço de transporte público coletivo foi, sem dúvida, uma grande surpresa para a maioria da população do Distrito Federal e, arrisco supor, de todo o Brasil. Afinal, desde o fim da década de 1980 e mais acentuadamente a partir do início do governo Collor, em 1990, a onda de políticas neoliberais afastou o Estado brasileiro, em suas três esferas, do controle de vários serviços públicos, entre os quais destacam-se os de transporte urbano. O Brasil importava, assim, os então celebrados modelos adotados emblematicamente por Margaret Thatcher, no Reino Unido, e Augusto Pinochet, no Chile, entre outros.

É verdade que o longo registro de serviços mal prestados já dera fortes sinais em nosso país, o que havia levado o governador Leonel Brizola a encampar operadoras no Rio de Janeiro em 1985 e a prefeita Luíza Erundina a aprovar na Câmara de Vereadores a lei de municipalização do transporte urbano paulistano. A avalanche neoliberal, no entanto, a mesma que extinguiu a Empresa Brasileira de Transportes Urbanos (EBTU), soterrou as iniciativas de genuíno interesse público, fazendo prevalecer o discurso da ineficiência do Estado e da excelência da iniciativa privada.

Se o transporte coletivo, a despeito das honrosas exceções que confirmavam a regra, já não era grande coisa na maioria das cidades brasileiras, tratá-lo meramente com as leis do mercado levou-o às condições críticas que a população do Distrito Federal conhece tão de perto. Aqui, com intensidade ainda maior que em outros lugares, os serviços de transporte por ônibus concentraram-se nas mãos de poucos — no caso específico, três famílias — e atingiram níveis de degradação inimagináveis, se não fossem tão reais. Tudo em nome da escancarada acumulação primitiva de capital, não importando o que sofrem os usuários.

A força política desses grupos conseguiu manter o poder público longe de seus “negócios”, a ponto de os órgãos governamentais mal terem acesso aos dados operacionais (horários e itinerários praticados, por exemplo), e menos ainda aos valores de receitas e custos do sistema.

Em tal contexto, as iniciativas anunciadas no início do atual governo surgiram como um alento, uma demonstração de necessária e salutar vontade política para resgatar o papel de gestor do sistema para o Estado, ainda que houvessem suscitado compreensível ceticismo. De todo modo, os anúncios se materializaram, por exemplo, com o desmantelamento do escabroso esquema da Fácil, a deflagração do processo licitatório e a tenacidade em sustentá-lo nas esferas administrativas e judiciais contra as indecentes investidas dos que se acham donos do “negócio”.

Diante desse quadro, todos nós, cidadãos de bem do DF, temos motivos para torcer pelo sucesso da noticiada assunção e, na medida de nossas possibilidades, ajudar a fazer dar certo a gestão do serviço no interesse público. Se efetivamente der certo, a surpresa que a medida nos causou na manhã desta segunda-feira, em breve, será substituída por outra: por que demorou tanto?

(*) Professor do programa de pós-graduação em Transportes da Universidade de Brasília (UnB)

4 comentários:

Erivelton Guedes disse...

Caro professor, faço coro com o sr! Realmente o TP de Brasilia é incrivelmente ruim! Uma vergonha, ainda mais que é a capital de nosso país e uma cidade planejada, com espaço e toda a condição para um sistema decente. E espero que nao criem aquele monstro de estacionamento na Esplanada.

Erivelton Guedes disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
MARCOS NASCIMENTO disse...

Prezado Professor: Infelizmente o transporte de Brasília e cidades satélites não vai melhorar tanto, pois quem ganhou sozinha a bacia 5 foi a São José e quem ganhou sozinha a bacia 2 da rede de transporte coletivo foi a PIONEIRA do Grupo Constantino. Então fica pergunta:
1) pq o GDF colocou apenas 1 empresa por bacia (são 5 bacias) Quer dizer que se aparecessem 5 ou 6 empresas numa bacia só, apenas UMA iria ganhar o certame licitatório !
2) será que não teve empresas de fora de DF que poderiam ter ofertado melhores propostas do que as atuais vencedoras das bacias 2 e 5 ? Tenho ABSOLUTA CERTEZA que sim!
A

Anônimo disse...

Professor cadê o Ministério Público do DF que não investiga o GDF, a DFTrans, as empresas, enfim todos os envolvidos ?
Até agora não saiu o resultado da bacia 1 (a mais rentável) e tudo indica que ela vai mesmo ficar com a Viação Piracicaba (que opera em Santos, Uberaba, São Roque e várias cidades do Brasil) e que também tem gente da família Constantino, logo Piracicabana + a vencedora da bacia 2 (Pioneira - contrato já assinado no final de dezembro/2012) são da mesma família empresarial ! Não pode ! Uma operará a bacia 2 (já definida) e outra vai operar a bacia 1 (e as 2 concorrentes dela na bacia 1 não entram pois já estão em outras bacias, tratando-se da bacia 3 e 4, respectivamente da HP e Marechal, empresas de GO e Curitiba-PR.
Mas as empresas da área 1 e 2 justamente as maiores em extensão ficarão nas mãos de um só grupo.
Se eu fosse o Governador Queiroz CANCELAVA a licitação da bacia 1 e fazia tudo de novo. Melhor dizendo cancelava a da bacia 1 e 2 por causa da sacanagem dos donos da bacia 2 quererem colocar os parentes deles na bacia 1. As outras 2 concorrentes não devem ganhar também pois já ganharam as bacias 3 e 4.
De qualque forma torço pelo Governador que é uma pessoa bem intencionada em melhorar os precários transportes por ônibus da capital federal que conheço e muito bem!
Saudações e êxito em vossos projetos.